10 de setembro de 2012

Artigo do Professor Euges Lima: 'PROJETO FRANÇA EQUINOCIAL: A tentativa francesa de colonização do Maranhão no século XVII'

A presença francesa no Norte do Brasil, no século XVII, deve ser entendida dentro do contexto das disputas franco lusitanas. Num primeiro momento, meramente restrito à concorrência da indústria extrativa do pau Brasil e outros gêneros tropicais, para depois se tornar projeto de colonização com vistas a um estabelecimento permanente. Embora de iniciativa particular, o projeto de colonização francesa em terras do Maranhão contou com a chancela real.

Na medida em que a colonização portuguesa foi se tornando mais efetiva ao longo do litoral brasileiro, os franceses foram sistematicamente avançando em direção ao norte, as incursões francesas à costa do Brasil no decorrer dos séculos XVI e XVII, ocorreram no sentido sul/norte. Observe que as invasões gaulesas iniciaram-se no Rio de Janeiro em 1555 e culminaram no Maranhão em 1615.

Isso se deve principalmente em razão da união ibérica, em 1580. A exigência espanhola era que a ocupação e colonização do Brasil se desse em direção ao norte, ao contrário do que estava acontecendo até então (sentido sul). A intenção espanhola era proteger suas minas localizadas na região do Peru, de possíveis invasões estrangeiras.

O Maranhão e o Amazonas constituíam portas de entradas para essas regiões mineradoras. É nesse sentido que a colonização portuguesa, pós união peninsular, coincidiu com o banimento dos franceses dessas regiões mais localizadas ao norte. O Maranhão passou a ser alvo dos franceses, na medida em que constituía ainda uma das poucas áreas restante do litoral brasileiro livre da ação portuguesa.

Embora o nome de Daniel de la Touche, Senhor de la Ravardière seja comumente evocado como o principal líder da expedição francesa às terras maranhenses, é necessário, contudo, ressaltar a imprescindível participação de François de Razilly nos preparativos e administração dessa empresa, não só em termos religiosos como sugeriu o capuchinho francês Claude d’Abbeville, mas principalmente no que diz respeito à articulação para reunir recursos para o bom andamento dos negócios.

O projeto: França Equinocial era uma empresa cuja liderança era dividida entre Razilly e La Ravardière, sendo que em momento algum, o Senhor de Razilly assumira papel secundário. Se La Ravardière assume posição de liderança principal nos acontecimentos finais de 1614 a 1615 no Maranhão, isso se deu, certamente devido à ausência de Razilly que se encontrava na França.

Se por um lado, não podemos negar a intenção francesa em fundar uma colônia em plagas do Maranhão, por outro lado, os três anos e quatro meses que aqui permaneceram os franceses não foi tempo suficiente para que eles se consolidassem, no sentido de estabelecerem uma colônia propriamente dita ou até mesmo uma cidade. A chamada França Equinocial não conseguiu criar raízes, o projeto francês ainda estava em andamento quando da chegada dos portugueses.

A experiência francesa no norte do Brasil, em todos os seus aspectos, não chegou a se consolidar enquanto modelo de colonização típica do século XVII, as relações entre metrópole e colônia durante 1612 a 1615 não foram tão regulares assim, a ponto de se estabelecerem ali os fundamentos necessários que envolviam as relações metrópole e colônia, típicas do sistema colonial. Portanto, mais pertinente seria entendermos essa ocupação dos gauleses no Maranhão, como uma tentativa de colonização que foi frustrada pela vinda dos portugueses e não fundação de algo no Maranhão, seja uma colônia, seja uma cidade.

Na aventura francesa do Maranhão seiscentista, os indígenas eram peças- chave nos métodos de cooptação dos brancos. As alianças entre mairs (franceses) e Tupinambás, demonstram uma relação com o “outro”, feita com base em negociações comerciais, ao mesmo tempo em que também se constituía uma política para se viabilizarem em terras da América.

Sem o apoio das tribos Tupinambás do Maranhão, dificilmente os franceses tinham condições de se estabelecerem por estas terras. Os “Papagaios Amarelos”, como eles eram chamados pelos indígenas, tinha tanta consciência disso que procuram estabelecer leis que protegessem os índios, pois sabiam que o sucesso da empresa, dependia, do bom relacionamento entre os europeus, mas principalmente da relação amistosa entre franceses e nativos.

Os Tupinambás que foram descritos por cronistas franceses do início do século XVII, apesar de terem apresentados características semelhantes dos que habitavam outras regiões do Brasil, estavam razoavelmente preservados em sua cultura primitiva, visto o isolamento do Maranhão da ação de colonizadores portugueses antes da chegada dos franceses. Abbeville e d’Evreux, quando chegaram ao Maranhão em 1612, encontraram esses índios quase nada modificado culturalmente, ao contrário de franceses lançados em terras maranhenses, anterior à expedição de La Ravardière que já se encontravam praticamente “indianizados”.

Os Tupinambás maranhenses procuraram proteger sua comunidade, nesse sentido, a iniciativa em aliar-se aos franceses ocorre da necessidade desses índios de se protegerem da dominação lusitana, preservar sua cultura e suas próprias vidas. Emigrados de Pernambuco, fugindo da escravidão imprimida pela ação colonizadora portuguesa, assim como, em busca de uma possível “terra sem mal”, os Tupinambás buscaram estabelecer alianças com os franceses que disputavam com Portugal a posse do norte do Brasil.

O sonho francês acalentado há muito tempo em fixar um estabelecimento colonial no Brasil, mais uma vez não dá certo. O norte brasileiro não pertenceria aos mairs e a dúvida que durou muito tempo acerca da posse do território brasileiro, como assinalou o historiador Capistrano de Abreu, se definiria a favor dos perós (portugueses). Depois da derrota fragorosa na batalha de Guaxenduba e a partir da expulsão definitiva comanda por Alexandre de Moura, chega ao fim a pretensão francesa em colonizar o Maranhão. A França Equinocial entra, portanto para o rol das tentativas mal sucedidas de ocupação francesa em terras brasileiras.


EUGES SILVA DE LIMA é professor de história das redes publicas de educação estadual do Maranhão e municipal de São Luís, com especialização em teoria e metodologia para o ensino da história pela Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), secretário de Cultura do Sinproesemma e vice- presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM.

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